sábado, 23 de maio de 2009

Dragão do Mar no Ceará


O Centro Dragão do Mar de Arte e Cultura é uma infra-estrutura completa para o exercício do lazer e da arte, objetivando democratizar o acesso à cultura, gerar novos empregos e movimentar o mercado turístico cearense.

São 30 mil metros quadrados de área para vivenciar a arte e a cultura, com atrações como o Memorial da Cultura Cearense, o Museu de Arte Contemporânea, o Teatro Dragão do Mar, as salas de cinema do Espaço Unibanco Dragão do Mar, o anfiteatro Sérgio Mota, um Auditório e o Planetário.

Visitantes de todas as localidades e classes sociais, das mais variadas faixas etárias e de renda visitam o Centro Dragão do Mar de Arte e Cultura.
A premissa básica é a de que a programação artístico-cultural desenvolvida seja sempre plural, diversificada, inovadora e de alta qualidade, sofisticada até.
Porém, o acesso é democratizado, permitindo que a população de baixa renda possa ter acesso aos bens simbólicos ofertados.

Assim é que, alunos de escolas públicas e pessoas de comunidades carentes acessam gratuitamente ao Memorial, Museu e Planetário, desde que agendem previamente.

Aos domingos a visitação ao Memorial e Museu é gratuita para toda população.
A maioria dos eventos musicais é aberta ao público ou cobrada preços simbólicos, bem abaixo daqueles praticados pelo mercado.

Há ainda, espaços de lazer e entretenimento que estão abertos para toda a população todos os dias de funcionamento do Centro Dragão do Mar: Praça Verde Historiador Raimundo Girão, Espaço Rogaciano Leite F0, Espaço sob o Planetário, Praça Almirante Saldanha, etc.
O Governo do Estado do Ceará, através da Secretaria da Cultura, demonstrou ousadia e visão de futuro, ao construir o Centro Dragão do Mar de Arte e Cultura.

Não seria precipitado afirmar, com razoável grau de certeza, que se trata de um dos investimentos mais bem sucedidos em cultura no Estado e no Brasil neste final de século.

A arquitetura do Centro Dragão do Mar se caracteriza por suas linhas arrojadas, concebidas pelos arquitetos Delberg Ponce de Leon e Fausto Nilo. Construído em uma antiga área portuária, o centro cultural possui ainda, em seu entorno, uma série de bares, restaurantes, lojas de artesanato e teatros. Sua estética arrojada contrasta-se com casarões do início do século.



O Dragão do Mar na história do Ceará


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Liberdade. A palavra de ordem dos idos de 1800, no Ceará, também nomeia a jangada que pertencia Francisco José do Nascimento, o Chico da Matilde. A jangada foi levada à capital do Império a bordo de um navio mercante, como símbolo da resistência popular abolicionista nas terras de Alencar. O líder dos jangadeiros cravou seu nome na história como o lendário Dragão do Mar, deflagrando a greve dos seus companheiros. Sua ousadia e coragem paralisaram o mercado escravista no porto de Fortaleza nos dias 27, 30 e 31 de janeiro de 1881. Chico, filho da Matilde tinha, então, 42 anos.

Boa parte dos livros de História omite que outros ancoradouros e até mesmo esparsas lideranças da elite econômica do Estado tomaram posição idêntica e interromperam o fluxo de escravos em suas regiões e nas fronteiras com outras províncias do Nordeste, como nos conta a História do Ceará,organizado pela socióloga Simone de Souza (p.179). Antes e depois da greve que eternizou o Dragão do Mar, movimentos libertários como a “Sociedade Perseverança e Porvir”, a “Sociedade Cearense Libertadora” e jornais como o Libertador se destacam pela luta contra a escravidão. Mas foi a firmeza do mulato jangadeiro Chico da Matilde que ultrapassou os limites da província e alcançou o Império, mostrando a força da resistência nordestina que consagrou o maior herói popular da história abolicionista do Ceará.

O Dragão do Mar é filho de Canoa Quebrada, Aracati. No dia 15/04 de 1839, o pescador Manoel do Nascimento e dona Matilde Maria da Conceição receberam com alegria o filho Chico. Poucos anos depois, aos oito anos, Chico perde o pai e vai morar com outra família. Aos 20, aprende a ler. Torna-se chefe dos catraieiros (condutores de bote), trabalha na construção do porto de Fortaleza, é marinheiro, e finalmente é nomeado prático da Capitania dos Portos. Com a deflagração da greve, em 1881, é demitido. Três anos depois, com a libertação dos escravos, Chico da Matilde leva a embarcação Liberdade no barco negreiro Espírito Santo para o Rio de Janeiro. Mas a Liberdade ganha asas e toma rumo incerto. O jornalista catarinense Raimundo Caruso, conta original versão nas páginas do seu livro Aventuras dos Jangadeiros do Nordeste:

“A jangada Liberdade, de Francisco José do Nascimento, era a clássica, de troncos. Símbolo de uma resistência popular vitoriosa no Ceará, foi levada à Capital do Império a bordo de um navio mercante e, mesmo viajando no porão, inaugura a rota das futuras aventuras dos jangadeiros nordestinos em direção ao Sul. A embarcação foi exibida nas ruas do Rio de Janeiro, sob os aplausos da multidão, e pouco depois é doada ao Museu Nacional, onde foi recebida como valiosa peça etnográfica (...). Em seguida a jangada foi transferida para o Museu da Marinha (...), de onde, queimada, feita em pedaços ou desmontada, desapareceu”.

Até hoje não se sabe o destino da Liberdade, que uniu cearenses e permanece no imaginário de todos como a vitória concreta da solidariedade entre as raças, credos e timbres, do sertão ao litoral. Ao lado da vela, a imagem guerreira e emblemática do Dragão do Mar.

Nomadismo

Nomadismo é o nome que é dado às pessoas que não têm habitação fixa, ou seja, vivem mudando de um lugar para o outro sem moradia certa. São pessoas que vivem da caça, e que buscam em vários outros lugares, pastos para caçarem.



Depois que descobriram o barro, os nômades, passaram a criar animais e a fabricar algumas peças de barro e cerâmica para realizarem trocas. Atualmente ainda existem grupos de pessoas assim, como os nómadas mongóis. Na Índia, essa cultura nômade se caracterizou pela travessia das famílias com jangadas e caçavam com arco e flecha.

Performance e Recepção, A Vocalidade de Paul Zumthor





Durante algum tempo em nosso país, o suíço Paul Zumthor foi o menos popular, o menos estudado, o menos compreendido e estimado na pesquisa literária. Suas obras sempre estiveram vinculadas às ciências da linguagem e da comunicação.

No entanto, Zumthor, ao trazer a voz e a oralidade para dentro da escrita, oferece ao âmbito literário novas perspectivas de leitura e análise à medida que distingue o conceito de voz e de oralidade na literatura medieval.

É precisamente isso que ele mostra em sua obra A letra e a voz: a "literatura" medieval, particularmente nos capítulos VI, VII, XI e no posfácio. O livro foi publicado pela editora Companhia das Letras, em 1993, com tradução de Amálio Pinheiro e Jerusa Pires Ferreira.

Nesse estudo, Paul Zumthor afirma que, se houvesse uma ciência da voz, ela não estaria centralizada em uma única forma de conhecimento, pois deveria abranger, em princípio, a fonética e a fonologia, além da antropologia, da História e da psicologia da profundidade.

Em seu estudo, o teórico refere-se à voz do ser humano real, e não à do discurso, uma vez que o texto literário é uma voz que está dentro de um suporte escrito, portanto mediado ele já é uma representação.

Ao pesquisar algumas vozes para analisar a poesia oral e a vocal, Zumthor escolhe a Idade Média, pelo fato de esse período apresentar uma fronteira muito tênue com a voz, haja vista a literatura medieval ser contada e oralizada antes de escrita.

A maneira com que Zumthor desenvolve o assunto nos traz um grande impacto, principalmente ao afirmar que a voz não se reduz à palavra oral. Tal conceito remete à questão da palavra oral como qualidade simbólica da voz; já o tom, o timbre e a altura se apresentam como elementos não lingüísticos e de qualidade material.

Da mesma forma, Zumthor diferencia a voz cotidiana (popular), por sua dispersão, efemeridade e pragmatismo, ao reduzir-se, enquanto presença corporal, da voz poética (erudita), que por natureza concentra a intensidade do acontecimento para estimular e singularizar a voz enquanto presença corporal, a fim de enfatizar sua "carnalidade" (termo usado por Zumthor) e duração.

Vale dizer que o teórico, ao tratar da voz e de suas artes, não a divide em popular e erudita, pois não existe uma supremacia entre elas. Zumthor apenas questiona o que é cultura popular e cultura erudita.

A avaliação dos elementos que compõem os dois tipos de voz proporciona uma maior compreensão para a questão da performance.

Diretamente vinculada à voz poética, a performance é uma ação oral- auditiva pela qual a mensagem poética é simultaneamente transmitida e percebida, no tempo presente, em que o locutor assume voz, expressão e presença corporal (física), enquanto o destinatário, que não é passivo, também se inclui como presença corporal dentro da performance. Tais relações promovem uma importante compreensão sobre a escrita poética, considerada como linguagem secundária, pois como signo gráfico representa as palavras em ação e voz, que, ao utilizar a linguagem, não fala apenas sobre algo, mas se inclui naquilo que diz, dispondo-se como presença e performance.

Aspecto de relevância nos estudos de Zumthor são os vocalises, componentes da língua cultural que emergem da voz, do elemento vocal. Os vocalises são como "acordes" (se pudermos considerá-los assim), não lingüísticos, contudo, criadores de presença e de sentido. Esses elementos não são palavras, não são língua nem voz, porém suscitam uma presença no vazio e no silêncio. Consideramos a possibilidade do silêncio como vocalise, porque o silêncio não é ausência de informação, mas, sim, intervalo de presença, pois as probabilidades do vazio são imprescindíveis. Aliás, Zumthor acredita que a voz nasce de um espaço silencioso e depois retorna para o mesmo.

Os vocalises, embora não sejam palavras oralizadas, têm sentido enquanto presença corporal, portanto performática.

Outro ponto importante nos estudos de Zumthor é a presença da fala oral na enunciação, que se aproxima dos elementos palavra e voz. Dessa forma, entende-se que a fala oral se aproxima da palavra, por ser um elemento lingüístico, e da voz, por apresentar tom, ritmo e presença corporal, que na escrita apresenta diferentes implicações de enunciação.

Como demonstra o título da obra em questão, a proposta do estudo da "letra" e da "voz", apesar de estar vinculada à literatura medieval, apresenta questões fundamentais para a compreensão da narrativa contemporânea, que advém da fala oral na enunciação. Temos como exemplo o narrador que, ao se apresentar como intérprete, investe-se da autoria e coloca em crise a mediação e a assinatura autoral.

Essa proximidade entre narrador, intérprete e autor instaura-se pela presença do performativo, em que a história se aproxima da narração, pois através da leitura silenciosa, mediada pela escrita, a fala oral é atualizada e setorna presente no momento da leitura. Dessa forma, as relações traçadas entre escrita, voz e fala fazem com que o discurso performativo seja o próprio acontecimento; logo, o acontecer não está fora do discurso, mas sim nele mesmo, na ação que se faz presença.

No que concerne à escritura, Zumthor estabelece uma diferenciação importante entre texto e obra, pois a obra está em constante movimento, transcende o texto pelo que é poeticamente comunicado no tempo presente da leitura – sonoridade, ritmo, elementos visuais convidam o leitor não só à leitura, mas também a interagir corporalmente com a obra, à medida que apresenta a palavra encenada num ato dialógico entre o leitor e o texto.

Para Zumthor, o termo obra compreende a totalidade dos fatores da performance, na qual o discurso se torna gesto não-verbal, e aquilo que é palavra torna-se não-palavra.

No caso do texto, o teórico o entende como uma estrutura fixada pela escrita impressa, que mantém o mesmo texto, cuja seqüência lingüística é fechada, legível, de sentido global e de tempo efêmero.

Fato interessante a ser observado é que, se o texto é legível e a obra é, ao mesmo tempo, audível e visível, essas diversas qualidades não são simétricas ou comparáveis, mas estabelecem uma relação, pois, do texto, a voz em performance extrai a obra. É o texto que guarda em si as virtualidades da voz, porém só no momento de "atualização" a obra é corporificada.

Nesse sentido, a atualização sempre implica em movência, variação entre o texto escrito e o corpo virtual, que é voz e presença, criado pelo intérprete. Na movência, o que permanece é o arquétipo (texto escrito), diretamente ligado à tradição, enquanto a atualização varia a cada nova leitura. Sendo assim, a variação acontece sempre no tempo presente, já o arquétipo não. Conclusões como essa foram possíveis após a leitura dessa obra de Zumthor, que traz as informações necessárias para um aprofundamento reflexivo mais seguro.

Por esse contexto, entende-se que a voz só pode ser capturada em movência, no movimento entre o texto e a obra, na relação entre o que está escrito e a atualização. O texto fixado pela escrita impressa sempre será o mesmo, mas, enquanto voz e atualização, ele sofre mutações. Elemento fundamental para compreender como colher os índices de vocalidade numa escritura poética é a performance, pois a captura da voz não está no significado semântico do texto, mas na ação materializadora do discurso poético, na maneira como ele é transformado em voz.

Além disso, Zumthor considera a intertextualidade e a intervocalidade como elementos de movência. Para o teórico, a intertextualidade não é apenas o texto escrito, mas também a presença de uma voz que "fura" o discurso e atualiza a obra. Dessa forma, o texto é o mesmo, mas a obra e a voz não.

Já a intervocalidade implica movência do texto no espaço-tempo que o modifica na atualização. O teórico chama de intervocalidade porque o texto é o mesmo aparentemente, porém, quando atualizado, ele ultrapassa o espaço-tempo e recebe nova atualização. A intervocalidade é a voz que faz um caminho no tempo e no espaço e carrega consigo a voz da tradição, que ao atravessar os tempos apresenta outra intenção, pois o lugar de onde se olha o texto foi modificado, e a atuação vocal diante dele mudou.

Em suma, a performance é uma fronteira tênue entre a voz e a letra, em que os diversos elementos que a compõem – oralidade, movência, texto, arquétipo, vocalidade etc. – oscilam no tempo e no espaço. Embora apenas o leitor especializado tenha contato com essas informações, a performance, por ser encenação, também envolve o leitor não-especializado na emoção da leitura. Como afirma Zumthor, "é o todo da performance que constitui o lócus emocional em que o texto vocalizado se torna arte e donde procede e se mantém a totalidade das energias que constituem a obra viva". A performance é sempre aberta ao acaso e nômade por natureza.

Paul Zumthor mostra nessa obra não somente a trajetória dos estudos de voz e oralidade na literatura da Idade Média, mas também nos oferece suporte teórico para a compreensão das narrativas contemporâneas. O teórico, com seu pioneirismo nos estudos da performance, apresenta-nos uma obra complexa e instigante, que traz com justeza informações relevantes sobre os elementos performativos de um texto literário e, ao mesmo tempo, deixa índices para novas pesquisas e descobertas no âmbito dos estudos da voz.

Paul Zumthor: Uma Fronteira Tênue Entre A Voz E A Letra
* Por Lilian Silva Salles
* Publicado 15/12/2007
* Resumos e Resenhas

Fonte: Webartigos.com | Textos e artigos gratuitos, conteúdo livre para reprodução. 1

João Candido- O Almirante Negro



João Candido
Primeiro Herói Brasileiro do Século XX


Nascido na então Província do Rio Grande do Sul, no município de Encruzilhada do Sul, que havia sido distrito de Rio Pardo, filho dos ex-escravos João Felisberto Cândido e Inácia Felisberto, apresentou-se na Escola de Aprendizes Marinheiros com uma recomendação de "atenção especial", aos cuidados do Delegado da Capitania dos Portos em Porto Alegre. Esta recomendação deveu-se à iniciativa de um velho amigo e protetor de Rio Pardo, o então capitão de fragata Alexandrino de Alencar, que o encaminhara àquela escola.

Desse modo, numa época em que a maioria dos aprendizes era recrutada pela polícia, João Cândido alistou-se com o número 40 na Marinha do Brasil (1894), aos 13 anos de idade, ingressando como grumete a 10 de dezembro de 1895, fazendo a sua primeira viagem como Aprendiz de Marinheiro[1].

Em 1908, para acompanhar o final da construção de navios de guerra encomendados pelo governo brasileiro, João Cândido foi enviado para a Inglaterra, onde tomou conhecimento do movimento realizado pelos marinheiros britânicos entre 1903 e 1906, reivindicando melhores condições de trabalho.

O movimento dos marinheiros da Armada

O uso da chibata como castigo na Armada brasileira já havia sido abolido em um dos primeiros atos do regime republicano, o decreto número 2, de 16 de Novembro de 1889, assinado pelo então presidente marechal Deodoro da Fonseca. Todavia, o castigo cruel continuava de fato a ser aplicado, a critério dos oficiais. Num contingente de 90% de negros e mulatos, centenas de marujos continuavam a ter seus corpos retalhados pela chibata, como no tempo da escravidão. Entre os marinheiros, insatisfeitos com os baixos soldos, com a má alimentação e, principalmente, com os degradantes castigos corporais, crescia o clima de tensão.

Ainda na Grã-Bretanha, e depois, ao retornarem ao Brasil, os marinheiros que lá estiveram para acompanhar a construção dos encouraçados Minas Gerais e São Paulo, iniciaram um movimento conspiratório com vistas a tomar uma atitude mais efetiva no sentido de acabar com a Chibata na Marinha de Guerra.

As eleições presidenciais de 1910, embora vencidas pelo candidato situacionista marechal Hermes da Fonseca, expressaram o descontentamento da sociedade com o regime vigente. O candidato oposicionista, Rui Barbosa, realizou intensa campanha eleitoral, reforçando a esperança de transformações do povo brasileiro.

Esgotadas as tentativas pacíficas e propositivas dos marinheiros, incluindo uma audiência de João Cândido no Gabinete do presidente anterior, Nilo Peçanha, os marinheiros decidiram que iriam fazer um motim pelo fim do uso da chibata em 25 de Novembro de 1910.

Entretanto, em 16 de novembro, um dia após a posse do marechal Hermes da Fonseca, o marinheiro Marcelino Rodrigues de Menezes foi punido com 250 chibatadas, que não se interromperam nem mesmo com o desmaio do mesmo, conforme noticiado pelos jornais da época, aplicadas na presença de toda a tripulação do Encouraçado Minas Gerais, nau capitânea da Armada. Este fato antecipou a data programada para o motim, de 25 para 22 de Novembro de 1910.

Revolta da Chibata

No dia 22 de novembro de 1910, João Cândido deu início ao levante, assumindo o comando do Minas Gerais, pleiteando a abolição dos castigos corporais na Marinha de Guerra brasileira. Foi designado à época, pela imprensa, como Almirante Negro. Por quatro dias, os navios de guerra Minas Gerais, São Paulo, Bahia e Deodoro apontaram os seus canhões para a Capital Federal. No ultimato dirigido ao Presidente Hermes da Fonseca, os revoltosos declararam: "Nós, marinheiros, cidadãos brasileiros e republicanos, não podemos mais suportar a escravidão na Marinha brasileira". Embora a rebelião tenha terminado com o compromisso do governo federal em acabar com o emprego da chibata na Marinha e de conceder anistia aos revoltosos, João Cândido e os demais implicados foram detidos.

Expulsão da Marinha

Pouco tempo depois, a eclosão de um novo levante entre os marinheiros, agora no quartel da ilha das Cobras, no Rio de Janeiro, em 9 de Dezembro de 1910, foi reprimida pelas autoridades.

Apesar de não haver participado deste levante, João Cândido foi expulso da Marinha, sob a acusação de ter favorecido os rebeldes. Em Abril de 1911 foi detido no Hospital dos Alienados, como louco e indigente, de onde foi solto em 1912, absolvido das acusações juntamente com os seus companheiros. À época, o seu defensor foi o rábula Evaristo de Moraes, contratado pela Ordem de Nossa Senhora do Rosário e dos Homens Pretos, que declinou o recebimento dos honorários que lhe eram devidos.

Banido da Marinha, João Cândido sofreu grandes privações, vivendo precariamente, trabalhando como estivador e descarregando peixes na Praça XV, no centro do Rio de Janeiro.

De acordo com a sua ficha, nos quinze anos em que permaneceu na Marinha, foi castigado em nove ocasiões, preso entre dois a quatro dias em celas solitárias "a pão e água", além de ter sido duas vezes rebaixado de cabo a marinheiro. A sua ficha registra ainda dez elogios por bom comportamento, o último três meses antes da revolta.

A sua vida pessoal foi profundamente abalada pelo suicídio de sua segunda esposa (1928). Em 1930 foi novamente detido, acusado de subversão.

Adesão ao Integralismo

Em 1933 foi convidado e aderiu à Ação Integralista Brasileira[2][3], movimento nacionalista de direita inspirado no fascismo italiano fundado em 1932 pelo escritor Plínio Salgado, chegando a ser o líder do núcleo integralista de Gamboa, no Rio de Janeiro. Em entrevista gravada em 1968, João Cândido declarou manter sua amizade com Plínio Salgado e de ter orgulho em ter sido integralista, o que está evidenciado na entrevista que concedeu ao médico-historiador Hélio Silva e que se encontra arquivada no Museu da Imagem e do Som (MIS), no Rio de Janeiro.

Em 1959 voltou ao Sul do País para ser homenageado, mas a cerimônia foi suspensa por interferência da Marinha do Brasil.

Falecimento

Discriminado e perseguido até ao fim de sua vida, se recolheu no município de São João de Meriti, onde veio a defalecer de câncer no Hospital Getúlio Vargas, no Rio de Janeiro, pobre e esquecido, em 1969, aos 89 anos de idade.

Legado, homenagens e resgates

A sua memória foi resgatada na década de 1970 pelos compositores João Bosco e Aldir Blanc, no samba "O mestre-sala dos mares".

Em outubro de 2005, o deputado nacionalista Elimar Máximo Damasceno (PRONA/SP) apresentou o projeto de lei n. 5874/05, determinando inscrever o nome de João Cândido no "Livro dos Heróis da Pátria", que se encontra no Panteão da Pátria e da Liberdade Tancredo Neves, na Praça dos Três Poderes, em Brasília (DF).

Em Setembro de 2007, faleceu, aos 82 anos de idade, Zeelândia Cândido, filha mais nova de João Cândido, que dedicou a vida a obter a reintegração do nome de seu pai à Marinha, corporação de onde saiu sem quaisquer direitos.

Em 22 de Novembro de 2007 (aniversário de 97 anos da Revolta), foi inaugurada uma estátua em homenagem ao "Almirante Negro", nos jardins do Museu da República, antigo Palácio do Catete, bombardeado durante a revolta. A estátua, de corpo inteiro, de João Cândido com o leme em suas mãos, foi afixada de frente para o mar. Como parte da solenidade, que teve a presença de autoridades, familiares e representantes dos movimentos sociais, foi exibido o filme Memórias da Chibata, de Marcos Manhães Marins, e feita uma exposição fotográfica da Revolta da Chibata, sob a curadoria do cientista político e juiz de direito João Batista Damasceno.

Em 24 de julho de 2008, 39 anos depois da morte de João Cândido Felisberto, publicou-se, no Diário Oficial da União, a Lei Nº 11.756 que concedeu anistia[4] ao líder da Revolta da Chibata e a seus companheiros, idéia que partiu do Senado Federal e foi aprovada pela Câmara dos Deputados, em 13 de maio de 2008, dia em que se comemora a Abolição da Escravatura no Brasil.

No entanto, a lei foi vetada na parte em que determinava a reintegração de João Cândido à Marinha do Brasil. O motivo do veto é que esse reabilitação "post mortem" importaria em impacto orçamentário para o qual a lei não apontou a referida fonte de custeio. Assim, uma vez que tal reconhecimento imporia à União o pagamento dos soldos atrasados e das promoções que lhe seriam devidas, bem como na concessão de aposentadoria e pensão aos seus dependentes, nesse particular a lei foi vetada por ser contrária ao interesse público, no julgamento da equipe do governo federal.

Fonte: Wikipédia, a enciclopédia livre.

FILME: MEMÓRIAS DA CHIBATA

Sinopse
MEMÓRIAS DA CHIBATA
Diretor: Marcos Manhães
Ano: 2005
Juca, um menino negro de 7 anos que vende balas na rua, vê seus amigos e sua mãe apanharem de seu padrasto sem nada poder fazer, mas um dia, na favela onde mora, sua avó lhe revela que ele é bisneto do líder da Revolta da Chibata, João Cândido, e inspirado por estas memórias , o menino toma uma atitude radical que pode mudar o rumo de sua vida.

classificação etária: 12 anos

Projeto recebeu Prêmio no Concurso Público do Ministério da Cultura

Prêmio de MELHOR CURTA-METRAGEM de ficção do 15º DIVERCINE - Uruguai

Prêmio de MELHOR ROTEIRO no 4º CINEAMAZÔNIA

Prêmio de MELHOR ATRIZ para Léa Garcia na 33ª Jornada da Bahia

João Cândido, da Revolta da
Chibata, pode virar herói da pátria


O líder da Revolta da Chibata de 1910, João Cândido Felisberto, poderá ter seu nome incluído no Livro dos Heróis da Pátria, que se encontra no Panteão da Liberdade e da Democracia, na praça dos Três Poderes, em Brasília.

Surpreendentemente, a iniciativa não veio das forças de esquerda no Parlamento, nem do Rio de Janeiro, onde João Cândido viveu até os 89 anos de idade, reverenciado como uma espécie de herói popular. O Projeto de Lei 5874/05 foi apresentado pelo deputado Elimar Máximo Damasceno (Prona-SP).

A Revolta da Chibata ocorreu em unidades da Marinha de Guerra brasileira baseadas no Rio de Janeiro, em novembro de 1910. Os marinheiros tomaram os principais navios da Armada, em protesto contra suas condições de trabalho, os alimentos estragados que lhes eram oferecidos, os trabalhos pesados que lhes eram impostos e principalmente o costume degradante da do castigo da chibata, herança da escravidão.

"Na época, a Marinha brasileira estava dentre as mais fortes do mundo. Já o tratamento dos marinheiros repetia as piores tradições. João Cândido, filho de escravos, liderou a revolta pela dignidade humana em nossa Marinha e em nosso país", argumentou Damasceno.

"O Almirante Negro"

Os marinheiros tinham contato com o movimento operário e os partidos marxistas da Europa, onde iam acompanhar as fases finais de construção dos navios adquiridos pela Marinha de Guerra. O próprio João Cândido, como marinheiro de 1ª classe, seguiu para a Europa, onde assistiu ao final da construção do encouraçado Minas Gerais. Assim, a rebelião foi cuidadosamente preparada, inclusive com comitês clandestinos em cadabelonave.

A revolta teve início na madrugada de 23 de novembro de 1910, em resposta ao castigo de 250 chibatadas sofrido pelo marinheiro Marcelino Rodrigues de Menezes. Sob o comando de João Cândido, amotinaram-se as tripulações dos encouraçados Minas Gerais e São Paulo e também dos cruzadores Barroso e Bahia, reunindo mais de dois mil revoltosos.

A cidade do Rio de Janeiro, então capital da República, foi mantida por cinco dias sob a mira de canhões. João Cândido recebeu então o apelido de "o Almirante Negro", pela maestria com que comandou a frota em evoluções depa Baía da Guanabara.

O então presidente da República, Hermes da Fonseca, não encontrou saída que não fosse ceder às exigências dos marinheiros. "No dia 25 de novembro, o Congresso, apressadamente, aprovou as reivindicações dos marujos, incluindo a anistia. João Cândido, confiando nessa decisão, resolveu encerrar a rebelião, recolhendo as bandeiras vermelhas dos mastros", conta o autor da proposta.

A revanche da reação

Três dias depois, porém, veio a traição. O então ministro da Marinha determinou a expulsão dos líderes do movimento. Os marinheiros tentaram reagir, mas o governo lançou violenta repressão que culminou com dezenas de mortes, centenas de deportações e a prisão de João Cândido. "O Almirante Negro" foi colocado numa masmorra da Ilha das Cobras de onde foi o único a sair vivo, de 18 marinheiros.

Solto anos depois, João Cândido passou a viver como vendedor de peixes na Praça Quinze, Rio de Janeiro. "Morreu em 1969, sem patente e na miséria. Agora é hora de a nação honrá-lo, inscrevendo seu nome no livro dos heróis da pátria", defendeu Damasceno.

Tramitação

O projeto tramita em caráter conclusivo e será examinado pelas comissões de Educação e Cultura; e de Constituição e Justiça e de Cidadania.

Com informações
da Agência Câmara




A Revolta da Chibata

No ano de 1910, mais de 200 marujos agitaram a Baía de Guanabara, ao se apoderarem de navios de guerra para exigir o fim dos castigos corporais na Marinha do Brasil, herança do período imperial, onde essa arma era tida como a mais importante e dirigida pelos mais "aristocráticos" oficiais. Foi a Revolta da Chibata, liderada por João Cândido, o Almirante Negro.


O Minas Gerais, um dos modernos navios
recém-adquiridos pela Marinha na época da Revolta


O Brasil era uma das maiores potências navais do mundo, destacando-se a sua Esquadra Branca formada pelos encouraçados Minas Gerais e São Paulo, pelos cruzadores Rio Grande do Sul e Bahia e por mais 18 navios. O Governo gastara uma fortuna para modernizar sua esquadra, mas o código disciplinar da Marinha era o mesmo do tempo da monarquia, assim como os arbitrários processos de recrutamento. Criminosos e marginais, produtos de uma sociedade que lhes negava maior sorte, eram colocados lado a lado com homens simples do interior para cumprir serviço obrigatório durante 10 a 15 anos! As desobediências ao regulamento eram punidas com chibatadas. Por isso, as revoltas ocorriam antes mesmo do ingresso na corporação.

O decreto nº 3, de 16 de novembro de 1889, um dia após a Proclamação da República, extinguiu os castigos corporais na Armada, mas em novembro do ano seguinte o marechal Deodoro, contraditoriamente, tornou a legalizá-los: "para as faltas leves prisão e ferro na solitária, a pão e água; faltas leves repetidas, idem por seis dias; faltas graves, 25 chibatadas".

Como os reclamos dos marujos não foram ouvidos, eles passaram a conspirar. Uma primeira advertência foi feita durante a ida de uma divisão da Marinha às comemorações da Independência chilena, em que ocorreram 911 faltas disciplinares, a maioria punida com açoites: "Venho por meio destas linhas pedir para não maltratar a guarnição deste navio, que tanto se esforça por trazê-lo limpo. Aqui ninguém é salteador nem ladrão", dizia um aviso ao comandante de um dos navios, assinado por um marinheiro conhecido como Mão Negra.

Na madrugada de 16 de Novembro a Guanabara estava repleta de navios estrangeiros que aportaram para a posse do marechal Hermes da Fonseca na presidência da República. Ao raiar do dia, toda a tripulação do navio Minas Gerais foi chamada ao convés para assistir aos castigos corporais a que seria submetido o marinheiro Marcelino Rodrigues Menezes. Na noite anterior ele ferira a navalhadas o cabo Valdemar, que o havia denunciado por introduzir duas garrafas de cachaça no navio. Sua pena: 250 chibatadas e não mais 25 como vinha acontecendo.

Junto à tripulação do navio havia também oito carrascos oficiais. Depois de examinado pelo médico de bordo e considerado em perfeitas condições físicas, Marcelino foi amarrado pelas mãos e pés e submetido ao castigo. Durante o castigo, Marcelino desmaiou de dor, mas a surra continuou. Ao fim das 250 chibatadas, suas costas estavam banhadas em sangue, lanhadas de cima para baixo. Desacordado, ele foi desamarrado, embrulhado num lençol e levado aos porões. Lá jogaram iodo em suas costas e o deixaram estrebuchando no chão.

A Campanha Civilista de Rui Barbosa à presidência da República, as revoltas populares ocorridas no Rio de Janeiro na primeira década do século XX e o descontentamento de diversos setores da sociedade com o tipo de República liberal que foi instaurada no país, foram fatores que fizeram parte do contexto no qual se insere a Revolta da Chibata, deixando à mostra o grande descontentamento social presente no Brasil na época anterior a I Grande Guerra. Expondo assim a inserção dos marinheiros na vida social da capital federal.

Tendo que se adicionar ainda a esse painel a falta crônica de mão-de-obra para a Marinha de Guerra, além do alistamento militar feito de maneira brutal, engajando criminosos (muitas vezes capoeiras), separando famílias e engajando homens e adolescentes por vinte anos, tempo que muitos deles não resistiam. Apesar de já existirem as primeiras Casas de Aprendiz de Marinheiros, locais destinados a órfãos e meninos pobres que eram educados para vida como praças da Marinha de Guerra, eram homens mestiços ou negros, em sua maioria, que serviam ao projeto de país e ao projeto civilizatório das massas perigosas, na visão das elites. Todavia, tais homens entrando em contato não somente com o duro labor, mas, também com populações do país inteiro sem esquecer das missões internacionais, possivelmente proporcionaram uma maior compreensão da realidade deles. Tornando cada vez mais latente e insustentável sua situação, a ponto de após a renovação de parte da esquadra de guerra, com a aquisição de encouraçados britânicos, deixou mais claro a falta de qualificação e o arcaísmo das codificações da Marinha de Guerra. Para tanto os marinheiros sublevados filtraram dos discursos políticos existentes algumas idéias para fundamentar suas revindicações como revela uma carta enviada por um marinheiro sublevado para o jornal Correio da Manhã de 25/11/1910:



Ao lado de um dos marinheiros, João
Cândido lê o manifesto da Revolta:
(Agência Estado)


“Rio de Janeiro, 22 de novembro de 1910 – Ilustrado sr. redator do Correio da Manhã – É doloroso o fato que ora se passa na nossa marinha de guerra, mas, sr. redator, quem os culpados? Justamente os superiores da referida Armada, estes que deviam encarar os seus subordinados como homens servidores da pátria; pelo contrario, eles são tratados como desprezíveis e sujeitos, á simples falta, nos castigos mais rigorosos possíveis. Têm hoje como símbolo do martírio desses infelizes a palmatória, as algemas, e o chicote, e tudo isso, ilustre sr. redator, na marinha que, conforme os plano do sr. ex-ministro dizia civilizar-se. A escravidão terminou-se a 13 de maio de 1888, com a áurea lei da liberdade, e os oficiais da nossa marinha de guerra, conquanto as leis militares tivessem abolido castigos, não ligaram importância às leis militares e à disciplina, castigando os seus subordinados com ódio com que os senhores castigavam os mãos escravos. Sr. redator, é doloroso sim, ver-se a nossa marinha de hoje passar fome e todas as privações, pelo descaso dos comandantes de navios da Armada. Com um pessoal resumido e sofredor, eles querem o serviço feito a tempo e hora, sem encarar o cansaço, isto quando em viagens longas, como se deu nestas vindas das nossas unidades da Europa para aqui.
Os nossos pobres marinheiros e foguistas vieram como verdadeiros escravos, passando fome e sendo constantemente castigados com os ferros, a chibata e o bolo; em um dos últimos navios chegados, o comandante, durante a viagem, em alto mar, mandava amarrar o pobre marinheiro e fazia com este fosse lavar e pintar o costado do navio. Foguistas, estes coitados, faziam 6 horas de quarto e não tinham o direito ao descanso que, pela lei, lhes toca, porque eram logo chamados para outros serviços. O verdadeiro navio negreiro. É necessário, sr. redator, que publiqueis estas mal escritas palavras, afim de que, chegando elas ao conhecimento das autoridades competentes, possam sanar o mal, e o fato igual não mais se reproduza na nossa marinha de guerra. É necessário que os oficiais da Armada compreendam que estamos no século da luz. Abaixo a chibata, as algemas e a palmatória – Um marinheiro.”


O uso do açoite, como visto, continuou sendo aplicado nos marinheiros como medida disciplinar, como no tempo em que existia o pelourinho. Todos os marinheiros, na sua esmagadora maioria negros, continuavam a ser açoitados às vistas dos companheiros, por determinação da oficialidade branca.

Os demais marujos eram obrigados a assistir à cena infamante no convéns das belonaves. Com isto, criaram-se condições de revolta no seio dos marujos. Os seus membros não aceitavam mais passivamente esse tipo de castigo. Chefiados por Francisco Dias, João Cândido e outros tripulantes do Minas Gerais, navio capitânia da esquadra, organizaram-se contra a situação humilhante de que eram vítimas. Nos outros navios a marujada também se organizava: o cabo Gregório conspirava no São Paulo, e no Deodoro havia o cabo André Avelino.

Num golpe rápido, apoderaram-se dos principais navios da Marinha de Guerra brasileira e se aproximaram do Rio de Janeiro. Em seguida mandaram mensagem ao presidente da República e ao ministro da Marinha exigindo a extinção do uso da chibata.

O governo ficou estarrecido. Acharam tratar-se de um golpe político das forças inimigas. O pânico apoderou-se de grande parte da população da cidade. Muitas pessoas fugiram. Somente em um dia correram 12 composições especiais para Petrópolis, levando 3 000 pessoas. Todos os navios amotinados hastearam bandeiras vermelhas. Alguns navios fiéis ao governo ainda tentaram duelar com os revoltosos, mas foram logo silenciados. Com isto os marujos criaram um impasse institucional. De um lado a Marinha, que queria a punição dos amotinados, em conseqüência da morte de alguns oficiais da armada. Do outro lado, o governo e os políticos, que sabiam não ter forças para satisfazer essa exigência. Mesmo porque os marinheiros estavam militarmente muito mais fortes do que a Marinha de Guerra, pois comandavam, praticamente, a armada e tinham os canhões das belonaves apontados para a capital da República.

Depois de muitas reuniões políticas, nas quais entrou, entre outros, Rui Barbosa, que condenou os “abusos com os quais, na gloriosa época do abolicionismo, levantamos a indignação dos nossos compatriotas”, foi aprovado um projeto de anistia para os amotinados. Com isto, os marinheiros desceram as bandeiras vermelhas dos mastros dos seus navios. A revolta havia durado cinco dias e terminava vitoriosa. Desaparecia, assim, o uso da chibata como norma de punição disciplinar na Marinha de Guerra do Brasil.

As forças militares, não-conformadas com a solução política encontrada para a crise, apertaram o cerco contra os marinheiros. João Cândido, sentindo o perigo, ainda tentou reunir o Comitê Geral da revolução, inutilmente. Procuraram Rui Barbosa e Severino Vieira, que defenderam a anistia em favor deles, mas sequer foram recebidos por esses dois políticos. Uniram-se, agora, civis e militares para desafrontar os “brios da Marinha de Guerra” por eles atingidos. Finalmente veio um decreto pelo qual qualquer marinheiro podia ser sumariamente demitido. A anistia fora uma farsa para desarmá-los.

São acusados de conspiradores, espalharam boatos de que haveria uma outra sublevação. Finalmente, afirmaram que a guarnição da ilha das Cobras havia se sublevado. Pretexto para que a repressão se desencadeasse violentamente sobre os marinheiros negros. O presidente Hermes da Fonseca necessitava de um pretexto para decretar o estado de sítio, a fim de sufocar os movimentos democráticos que se organizavam. As oligarquias regionais tinham interesse em um governo forte. Os poucos sublevados daquela ilha propuseram rendição incondicional, o que nãofoi aceito. Seguiu-se uma verdadeira chacina. A ilha foi bombardeada até ser arrasada. Estava restaurada a honra da Marinha.


João Cândido é escoltado para a prisão
(Agência Estado)

João Cândido e os seus companheiros de revolta foram presos incomunicáveis, e o governo e a Marinha resolveram exterminar fisicamente os marinheiros. Embarcaram-nos no navio Satélite rumo ao Amazonas.

Os 66 marujos que se encontravam em uma masmorra do Quartel do Exército e mais 31, que se encontravam no Quartel do 1º Regimento de Infantaria, foram embarcados junto com assassinos, ladrões e marginais para serem descarregados nas selvas amazônicas. Os marinheiros, porém, tinham destino diferente dos demais embarcados. Ao lado dos muitos nomes da lista entregue ao comandante do navio, havia uma cruz vermelha, feita a tinta, o que significava a sua sentença de morte. Esses marinheiros foram sendo parceladamente assassinados: fuzilados sumariamente e jogados ao mar.

João Cândido, embora não tenha participado do novo levante, também é preso e enviado para a prisão subterrânea da Ilha das Cobras, na noite de Natal de 1910, com mais 17 companheiros. Os 18 presos foram jogados em uma cela recém-lavada com água e cal. A cela ficava em um túnel subterrâneo, do qual era separada por um portão de ferro. Fechava-a ainda grossa porta de madeira, dotada de minúsculo respiradouro. O comandante do Batalhão Naval, capitão-de-fragata Marques da Rocha, por razões que ninguém sabe ao certo, levou consigo as chaves da cela e foi passar a noite de Natal no Clube Naval, embora residisse na ilha.

A falta de ventilação, a poeira da cal, o calor, a sede começaram a sufocar os presos, cujos gritos chamaram a atenção da guarda na madrugada de Natal. Por falta das chaves, o carcereiro não podia entrar na cela. Marques da Rocha só chegou à ilha às oito horas da manhã. Ao serem abertos os dois portões da solitária, só dois presos sobreviviam, João Cândido e o soldado naval João Avelino. O Natal dos demais fora paixão e morte.

O médico da Marinha, no entanto, diagnosticou a causa da morte como sendo "insolação". Marques da Rocha foi absolvido em Conselho de Guerra, promovido a capitão-de mar-e-guerra e recebido em jantar pelo presidente da República.

João Cândido continuou na prisão, às voltas com os fantasmas da noite de terror. O jornalista Edmar Morel registrou assim seu depoimento pessoal: "Depois da retirada dos cadáveres, comecei a ouvir gemidos dos meus companheiros mortos, quando não via os infelizes, em agonia, gritando desesperadamente, rolando pelo chão de barro úmido e envoltos em verdadeiras nuvens da cal. A cena dantesca jamais saiu dos meus olhos.

João Cândido enlouqueceu, sendo internado no Hospital dos Alienados.

Ele e os companheiros só seriam absolvidos das acusações em 1912. Tuberculoso e na miséria, conseguiu, contudo, restabelecer-se física e psicologicamente. Perseguido constantemente, morreu como vendedor no Entreposto de Peixes da cidade do Rio de Janeiro, sem patente, sem aposentadoria e até sem nome, este herói que um dia foi chamado, com mérito, de Almirante Negro.

Os que fizeram a Revolta da Chibata morreram ou foram presos, desmoralizados e destruídos. Seu líder, como visto, terminou sem patente militar, sem aposentadoria e semi-ignorado pela História oficial. No entanto, o belíssimo samba "O Mestre-Sala dos Mares", de João Bosco e Aldir Blanc, composto nos anos 70, imortalizou João Cândido e a Revolta da Chibata. Como diz a música, seu monumento estará para sempre "nas pedras pisadas do cais". A mensagem de coragem e liberdade do "Almirante Negro" e seus companheiros resiste.

HOMENAGEM DE JOÃO BOSCO E ALDIR BLANC À "REVOLTA DA CHIBATA"

"Mestre-Sala dos Mares", de João Bosco e Aldir Blanc, composto nos anos 70, imortalizou João Cândido e a Revolta da Chibata.

Sobre a censura à música, o compositor Aldir Blanc conta:

"Tivemos diversos problemas com a censura. Ouvimos ameaças veladas de que a Marinha não toleraria loas a um marinheiro que quebrou a hierarquia e matou oficiais etc. Fomos várias vezes censurados, apesar das mudanças que fazíamos, tentando não mutilar o que considerávamos as idéias principais da letra. Minha última ida ao Departamento de Censura, então funcionando no Palácio do Catete, me marcou profundamente. Um sujeito, bancando o durão, (...) mãos na cintura, eu sentado numa cadeira e ele de pé, com a coronha da arma no coldre há uns três centímetros do meu nariz. Aí, um outro, bancando o "bonzinho", disse mais ou menos o seguinte:
- Vocês não então entendendo... Estão trocando as palavras como revolta, sangue etc. e não é aí que a coisa tá pegando...
Eu, claro, perguntei educadamente se ele poderia me esclarecer melhor. E, como se tivesse levado um "telefone" nos tímpanos, ouvi, estarrecido a resposta, em voz mais baixa, gutural, cheia de mistério, como quem dá uma dica perigosa:
- O problema é essa história de negro, negro, negro...
"

O Mestre Sala dos Mares
(João Bosco / Aldir Blanc)

(letra original sem censura)

Há muito tempo nas águas da Guanabara
O dragão do mar reapareceu
Na figura de um bravo marinheiro
A quem a história não esqueceu

Conhecido como o almirante negro
Tinha a dignidade de um mestre sala
E ao navegar pelo mar com seu bloco de fragatas
Foi saudado no porto pelas mocinhas francesas
Jovens polacas e por batalhões de mulatas

Rubras cascatas jorravam das costas
dos negros pelas pontas das chibatas
Inundando o coração de toda tripulação
Que a exemplo do marinheiro gritava então

Glória aos piratas, às mulatas, às sereias
Glória à farofa, à cachaça, às baleias

Glória a todas as lutas inglórias
Que através da nossa história
Não esquecemos jamais

Salve o almirante negro
Que tem por monumento
As pedras pisadas do cais
Mas faz muito tempo
O Mestre Sala dos Mares
(João Bosco / Aldir Blanc)

(letra após censura durante ditadura militar)

Há muito tempo nas águas da Guanabara
O dragão do mar reapareceu
Na figura de um bravo feiticeiro
A quem a história não esqueceu

Conhecido como o navegante negro
Tinha a dignidade de um mestre sala
E ao acenar pelo mar na alegria das regatas
Foi saudado no porto pelas mocinhas francesas
Jovens polacas e por batalhões de mulatas

Rubras cascatas jorravam das costas
dos santos entre cantos e chibatas
Inundando o coração do pessoal do porão
Que a exemplo do feiticeiro gritava então

Glória aos piratas, às mulatas, às sereias
Glória à farofa, à cachaça, às baleias

Glória a todas as lutas inglórias
Que através da nossa história
Não esquecemos jamais

Salve o navegante negro
Que tem por monumento
As pedras pisadas do cais
Mas faz muito tempo

Fonte: História do Negro Brasileiro, Clóvis Moura, São Paulo: Editora Ática S.A., 1992 | CEFET (SP)

domingo, 17 de maio de 2009

Esculturas de Areia (Muito Bem Trabalhadas)

Postado Por:

Mundo Grump


Você pode não acreditar nas imagens que verá neste post. São as mais incríveis obras de arte, feitas apenas com areia. Testemunhas efêmeras que mostram o poder incomensurável de criação do ser humano.

Anualmente, festivais de diversos países elegem os melhores escultores de areia do mundo.

São pessoas obstinadas e de incrível talento que se reúnem em times ou trabalham sozinhas, em obras de areia que vão de pequenas cestas de batatas ultra-realistas a verdadeiros castelos de sonho.

Obras faraônicas que em pouco tempo se vão com o vento e a chuva, mas que ficam guardados eternamente em nossas memórias.

A seleção mostrada aqui envolve o trabalho de centenas de pessoas de diversos lugares do mundo.



E aí? Gostou? Comenta aí.